Em virtude da pandemia de COVID-19, todos estão cancelando seus voos. Para evitar a propagação do coronavírus, os países estão impondo proibições rigorosas de viagens e incentivando o distanciamento social, o que significa que não há viagens aéreas, a menos que seja absolutamente necessário.
As companhias aéreas estão sofrendo duros golpes: os aviões da Southwest estão apenas 20% cheios, o CEO da Delta disse que a procura caiu “ao contrário de tudo o que já vimos”, e a companhia aérea britânica de baixo custo EasyJet cancelou todos os serviços. A queda nos voos pode ter um efeito que ultrapassa os resultados da indústria da aviação. Pode dificultar a capacidade dos cientistas de fazer previsões meteorológicas.
Qual a relação direta entre esses dois fatores? Você não entendeu nada? A gente te explica na sequência. Acompanhe!
Aeronaves repassam informações aos serviços meteorológicos
As aeronaves transmitem continuamente dados para os centros de previsão do tempo. Geralmente, os aviões podem transmitir até 230.000 observações meteorológicas por dia, oferecendo o único olhar regular para a atmosfera superior.
Os dados que eles coletam sobre pressão do ar, temperatura, altura das nuvens, dentre outros, são uma parte crucial da previsão do tempo. Estudos mostram que essas observações de aeronaves reduziram os erros nas previsões meteorológicas para as seis próximas horas em 15% a 30%.
Em um comunicado de imprensa, o Centro Europeu de Previsões Meteorológicas de Médio Prazo (ECMWF, na sigla em inglês), alertou para a perda de dados de voo – que, segundo ele, só é secundária em relação aos dados de satélite em termos de valor para os meios de previsão.
O centro gere o Euro, um dos melhores (se não o melhor) modelos meteorológicos do mundo. Sem os dados para alimentá-lo, os meteorologistas ficam numa situação com muitos pontos cegos.
Entre os dias 3 e 23 de março, a instituição informou que recebeu menos 65 relatórios de aviões que sobrevoaram a Europa e 42% menos relatórios de aviões de todo o mundo. Eles dizem que dados de satélites recentemente instalados ajudarão a reduzir o problema da queda nas observações baseadas nos dados das aeronaves, mas como a pandemia de COVID-19 continua, ainda menos aeronaves devem voar, o que pode afetar as previsões em todo o mundo.
“Gostamos de dizer que o tempo não pode parar, não vai parar por nada, mas a COVID tem consequências involuntárias no setor climático. A redução do número de aeronaves limita a quantidade de dados ingeridos nos modelos NWP, levando a previsões de modelos menos precisas”, afirma o especialista Andrew Markowitz, pelo twitter.
Impacto é sentido no mundo inteiro
O Serviço Meteorológico Nacional dos Estados Unidos (NWS) diz que ainda não é possível quantificar o impacto exato que essa redução terá. A agência tem um modelo meteorológico rival conhecido como GFS. “A diminuição está ocorrendo apenas para certos voos e rotas e, embora haja uma redução dos voos comerciais de passageiros, ainda recebemos dados valiosos sobre aeronaves de transportadoras de carga”, disse a diretora de assuntos públicos do Serviço Meteorológico Nacional dos EUA, Susan Buchanan, observando que isso não necessariamente tornará a previsão dos meteorologistas menos precisa.
“Enquanto os relatórios meteorológicos automatizados das aeronaves comerciais fornecem dados excepcionalmente valiosos para modelos de previsão, nós também coletamos bilhões de observações da Terra de outras fontes que alimentam nossos modelos, como balões meteorológicos, rede de observação meteorológica de superfície, radar, satélites e bóias”, completou a meteorologista.
Já Rodrigo Yamamoto, meteorologista da Climatempo, disse que “a rota dos aviões não fazem uma cobertura completa do Brasil” e que o País “tem poucos dados meteorológicos de alta altitude” normalmente. “Existem satélites que fazem uma cobertura maior, assim vai haver impacto, mas não deve ser tão substancial. A parte mais alta da atmosfera é mais constante devido ao fato de estar longe dos efeitos da superfície dessa forma mais uniforme horizontalmente. Lógico que em um universo já escasso de informações quando temos uma redução leva a uma diminuição de uma tarefa (previsão) que é tão sensível à quantidade de dados”, afirma Yamamoto.
Poluição do ar também reduz
A agência dos EUA terá em breve acesso aos dados de uma nova constelação de satélites que poderá ajudar ainda mais a preencher a lacuna. Mas no comunicado de imprensa do ECMWF, o especialista em informação da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (que supervisiona a NWS), Christopher Hill, não parecia tão confiante.
“Estamos antecipando a redução substancial na disponibilidade de dados AMDAR [Transmissão de Dados Meteorológicos de Aeronaves] dos EUA para continuar nas próximas semanas, provavelmente gerando alguma medida de impacto nos resultados dos nossos sistemas de previsão numérica do tempo”, disse ele.
Rodrigo Yamamoto aponta que deve acontecer uma variação no clima, provavelmente uma “redução na temperatura devido à diminuição dos voos como ocorreu em 11 de Setembro na qual temperatura caiu 0.5º C”. Isso acontece “devido à ausência do efeito que trilha de condensação que os aviões produzem quando voam”, pondera o meteorologista da Climatempo.